Há anos - em tempo pós-abril mas de apartheid - fui convidado para participar numa digressão rugbística portuguesa à África do Sul. Recusei o convite, não fui e, numa altura que o rugby mundial tinha boicotado o contacto com o rugby sul-africano, dessas razões dei então notícia pública.
Recusei essa ida por óbvia oposição ao racismo mas também porque outra qualquer atitude violentaria sobremaneira o respeito e amizade pela minha tia Júlia, negra, moçambicana, irmã do meu pai e muito querida. Mas a base que sustenta a atitude de antiracismo que defendi e que defendo assenta em muito no conhecimento das posições de Nelson Mandela. No conhecimento que fui tendo das suas ideias e da justeza da sua luta contra o racismo.
"Todos os homens e mulheres que renunciem ao apartheid serão bem-vindos na nossa luta por uma África do Sul democrática e não racista; temos de fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para persuadir os nossos compatriotas brancos de que uma nova África do Sul sem racismo será um lugar melhor para todos." (Autobiografia, Nelson Mandela, Um longo caminho para a Liberdade.)
E assim transformou o rugby e, no simbolismo de vestir a camisola do "capitão" springbok na final do Mundial de 1995, permitiu-nos olhar a modalidade sem a repugnância de ícone da supremacia rácica e com o interesse que a expressão do jogo springbok sempre suscita.
Homem ímpar, extraordinário, que, com a sua partida, nos deixa mais pequenos mas também com a esperançosa certeza - em realização prática do pedido de Maio de 68 - que o impossível, porque dependendo de nós, é possível.