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terça-feira, 2 de maio de 2023

FRANCISCO SALGADO ZENHA, CENTENÁRIO DO NASCIMENTO

Comemora-se hoje o centenário do nascimento de Francisco Salgado Zenha, combatente antifacista, opositor da ditadura salazarista defensor de presos políticos, foi um dos fundadores do Partido Socialista em 1973, depois de, nos tempos de estudante, ter passado pelo Partido Comunista.

Conheci-o bem!

O Chico Zenha, como o conhecíamos, foi-me apresentado, nos anos 60, pela minha parceira tenista, Graça Costa Pereira, momentos antes de irmos responder ao um desafio para jogar uma quadrada mista no court do Clube Desportivo de Soutelo — ela que tinha familiares do lado paterno adversários do regime, disse-me ao ouvido: “ele é do reviralho!”. A quadrada seria jogada entre nós os dois, de um lado e ele e a Maria Irene, sua mulher e que era uma boa jogadora, do outro. 

Era neste court de Soutelo que jogávamos

A nossa escolha por este par bastante mais velho do que nós não era casual. Gostavam de jogar a sério, com um mínimo de competitividade e a Graça e eu tínhamos alguma qualidade — já tínhamos ganho diversos torneios, fazíamos parte da equipa sénior do Clube de Ténis de Miramar e fomos, nomeadamente, campeões nacionais de 3ª categorias em pares-mistos.

Assim durante o mês de Setembro, com o court marcado para os fins da tarde disputávamos jogos muito competitivos e bem divertidos. Que se repetiam quase todos os dias e que saltavam para o ano seguinte enquanto se repetiam as férias de Setembro, ali próximo dos rios Homem e Cávado. Hoje, tudo são apenas memórias porque os espaços e as casas são outras ou mesmo não existem. E os meses de Setembro também já não são o que eram…

Mais tarde encontramo-nos nas campanhas eleitorais de 1969  — nós enquanto estudantada universitária saltávamos de uma organização para a outra, CEUD, socialista e CDE comunista porque o que queríamos era a agitação — e até o risco — das reuniões políticas contra a ditadura e onde trocávamos duas, três palavras com os nomes míticos da oposição ao regime salazarento. Uma alegria!

Pós-25 de Abril,  assisti, então já enquadrado como membro da equipa da Imagem do MASP na candidatura de Mário Soares à Presidência da República e na altura em que se inventou o “Soares é fixe!”, à ruptura entre os até então “irmãos políticos”. A partir daí, vimo-nos cada vez menos mas mantive sempre — até hoje — um enorme respeito, consideração e amizade por ele. Tendo a clara noção da sua contribuição para a minha formação cívica e política. 

A sua frase “No plano moral — que é o que interessa — só é vencido quem desiste de lutar.” define-o como o Homem que foi e ajuda-nos a encarar as mais diversas situações.

sexta-feira, 12 de agosto de 2022

FERNANDO CHALANA, O PEQUENO GENIAL - 1959/2022



Vi jogar Chalana diversas vezes quer pelo SL Benfica, quer pela Selecção Nacional — era um jogador fabuloso! Dito canhoto jogava com qualquer dos pés com a mesma facilidade e sem que a decisão lhe atrasasse o processo de ultrapassar o adversário. Vê-lo jogar era um prazer tremendo.

Mais tarde, conheci-o pessoalmente. Apareceu, pela mão de alguém da equipa, no Estádio Universitário onde eu treinava a equipa principal do Grupo Desportivo de Direito e pediu para “treinar” connosco. Não que quisesse iniciar-se como jogador de rugby, mas porque queria manter a actividade física. Claro que foi imediatamente aceite e lá alinhou nas partes do treino em que a maior preocupação era a melhoria da condição física. Não sem uma condição prévia: ensinar os pontapeadores de serviço a chutar. E a facilidade com que ele o fazia… bola redonda ou oval era, nos seus pés, a mesma coisa. Alguns dos pontapeadores melhoraram com ele, com os conselhos que lhes deu… 
Muito simpático, gostávamos dele. Um formidável! Inesquecível!

domingo, 15 de maio de 2022

PAULO GIL: VIVEU COM JAZZ, MORREU COM JAZZ

fotos JPBessa
Amigos e companheiros de diversas andanças — direcção do Hot, programas de rádio, textos, concertos ou jam sessions de muitos e bons músicos ouvidos em mútua companhia (até lhe desenhei um símbolo para a sua bateria), longos momentos a gozar a vista da varanda de sua casa ou em férias familiares em conjunto no Algarve 
 
para chegarmos com a família à praia algarvia— uma pequena enseada de descida difícil — éramos obrigados a atravessar propriedades de outros (Valentim de Carvalho?) mas tínhamos a vantagem de, só pela vista da composição do grupo, da dimensão do areal e do trabalho descida/subida, ficar com a praia só para nós. O que permitia, naqueles tempos, que as senhoras se colocassem no à-vontade de mamas ao léu. Um dia, lá do alto da falésia, ouvimos voz grossa da GNR: “Ó senhoras! Não podem estar assim! Têm que pôr os sutiãs!”. Estranhámos a preocupação vinda de tão elevada moral pública, e, o Paulo e eu, pusemos os sutiãs das senhoras e perguntámos lá para cima: “E agora? Está bem assim?”… e nunca mais vimos os GNR durante o resto das férias.

— temos boas memórias e muitos e bons momentos conjuntos. E por maior que fosse o intervalo dos encontros a que a vida nos obrigava, era sempre com a proximidade do ontem que nos reencontrávamos.

Charlie Haden, Carlos Paredes e Fernando Assis no Hot com o Paulo
no canto em que, quando não tocava, gostava de ouver
(foto de JPBessa)
Isto de se ir avançando na idade tem o seu lado terrível: à medida que avançamos, vamos perdendo os amigos de sempre com enorme sofrimento. É a vida, sabias? dizem-nos. Pois é, mas a Natureza podia arranjar as coisas de outra maneira… é idiota ficarmos mais velhos e vermo-nos com menos amigos…
O Paulo ficará sempre e de cada vez que o jazz soar a primeira nota, nas minhas melhores memórias, recordando até, quando o ritmo assim o exigir, o raspar das baquetas no tecto do Hot porque a bateria, nos seus pratos e peles, se mostrava curta para garantir a criatividade. Bons gozos jazzísticos…
Com a Nossa Memória, até sempre, Paulo!



domingo, 25 de julho de 2021

UM DIA TRISTE


Otelo Saraiva de Carvalho foi o estratega do 25 de Abril. 
25 de Abril que não teria visto a luz sem a sua determinação, a sua ousadia, a sua audácia. Sem ele, sem o seu comando, o primeiro passo para a Liberdade e Democracia não teria existido e a minha vida — e a de tantíssimos outros —teria sido diferente. Diferente e muito pior! 

Nascido em 25 de Abril (1947) recebi de Otelo a melhor prenda de anos que alguma vez tive. Estou-lhe, por isso, eternamente grato!

Hoje é dia para lhe agradecer e um Dia de Luto Nacional seria a demonstração corajosa do devido apreço e não a cobarde moralice de um mistificador agrado tido por generalizado. Principalmente daqueles que são o que são porque houve a coragem de fazer o 25 de Abril — e Otelo foi o seu principal motor! Agradeçam, caramba!

Porque do resto, trataremos com a História, quando formos capazes de tratar de muitas outras controvérsias…

 

sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

CARLOS DO CARMO DE LISBOA PARA O MUNDO

 Começar um novo ano com a notícia da morte de um amigo não é fácil.


A primeira vez que falei com Carlos do Carmo foi há muitos anos em O Faia - por qualquer razão chegámos à fala e ficámos a saber quem era um e quem era o outro. Anos depois encontravamo-nos com maior regularidade, quase sempre no Procópio, onde, ao sabor de uns copos, trocavamos ideias entre culturas diversas, músicas, artes e políticas. Na política também estivemos numas mesmas campanhas... Conhecíamo-nos bem e fomos criando uma amizade das que perduram pelo tempo e que se mantêm independentemente das vezes em que a vida nos deixa encontrar.

Carlos do Carmo não era apenas a Voz - e que voz ele tinha - mas era muito mais do que isso Culturalmente retirou o Fado do espartilho em que o Estado Novo o tinha colocado e, apoiando novos fadistas e cantando novos poetas, entregou-o a quem ele pertence, a nós portugueses e bateu-se para fazer dele Património Imaterial da Humanidade; como cidadão mostrou-se sempre do lado da Democracia e do direito da pessoa humana e sempre que sentiu o desrespeito ou perigo pela Democracia, apresentou-se na 1ª linha. E foi sempre Voz!

Com a sua morte e se perdemos uma voz de combate pela Democracia, temos a sorte de guardar nas memórias tecnológicas o cantar dos seus discos ou dos seus concertos. Que se ouvirão sempre com particular agrado, cantando Lisboa como a cidade única que sempre reconheceu.

Até sempre, meu caro!

terça-feira, 1 de dezembro de 2020

EDUARDO LOURENÇO [1923-2020] UM PENSADOR EXEMPLAR

Tive a sorte de conhecer Eduardo Lourenço e só ganhei com isso. Aprendi sempre na sua companhia O facto de sermos ambos antigos alunos do Colégio Militar e com a tradição cultural que nos une, permitia-me um acesso mais fácil de linguagem e, por isso, uma mais fácil conversa a que ele ajudava sempre com o seu sentido de humor. O seu falecimento vai deixar-nos mais pobres na compreensão do nosso mundo, na criatividade de o interpretar, na imaginação de o descrever. E Portugal, perdendo o seu maior pensador, perdeu aquele que dava sentido ao seu passado, perspectivando-o num futuro que queria muito mais risonho do que o actual e a nossa vida fica mais pobre. Resta-nos o preito activo à sua memória, lendo e relendo a sua obra, meditando sobre os seus conceitos, seguindo o seu exemplo, agindo.
Há dias como este que, por mais que o sol brilhe, fica-nos a tristeza dos nevoeirentos dias de cinzento carregado que não nos deixam ir a lado algum. São dias muito incómodos estes, difíceis de ultrapassar numa infinidade de horas que parecem não acabar mais. Sirvo-me da boa memória de só ter tido a ganhar por o ter conhecido e ter tido a oportunidade de o ouvir para eliminar as sombras do seu desaparecimento. Até sempre, Eduardo!



quarta-feira, 20 de novembro de 2019

terça-feira, 10 de julho de 2018

HOOYAH!


FORMIDÁVEL! MISSÃO TERMINADA!

Os 13 membros da equipa de futebol dos Wild Boars (12 miúdos e um treinador) mais 3 Navy Seals tailandeses e o médico australiano, Richard Harris - estes últimos que estiveram desde a localização do grupo e durante todo este tempo em apoio aos jovens - foram salvos e retirados da gruta de Tham Luang numa operação que envolveu muita gente e que exigiu, para além de uma notável liderança e coordenação, um aglomerado de conhecimentos vários traduzidos em competência permanente de um total de 90 mergulhadores, centenas de voluntários, pessoal médico, motoristas, pilotos, cozinheir@s, polícia. espeleólogos, etc. etc. Formidável!

O salvamento deste grupo tem também uma dívida de gratidão para com o falecido mergulhador tailandês Saman Kunan cuja morte terá alertado os responsáveis pela operação para a necessidade de rever processos que, assim, permitiram que as operações se realizassem sem problemas de maior, possibilitando a saída de todos os outros.

A cooperação internacional, o primado da competência sobre as vaidades, a determinação e a resiliência dos jovens e o papel fundamental do seu treinador nos primeiros dias - estiveram retidos na gruta desde 23 de Junho - quando nada sabiam da possibilidade de serem resgatados, foram determinantes para a chegada a bom porto.

Que esta operação nos possa servir de exemplo e de aprendizagem para eventuais futuras operações de socorro e que o momento de solidariedade universal que representa nos possa também servir de guia para alterar a aporofobia que representa a atitude europeia sobre os refugiados que atravessam o Mediterrâneo.

segunda-feira, 9 de julho de 2018

HOMENAGEM AOS TANTOS

autor: Sisedea
Criado pelo artista plástico tailandês Sisedea, este cartoon - muito divulgado já nos canais sociais - representa, segundo Michael Safi jornalista do The Guardian presente na Tailândia, o envolvimento dos diversos grupos no salvamento do grupo de miúdos futebolistas e do seu treinador, encurralados na gruta de Tham Luang e que são representados por animais.
O elefante branco, que comanda, representa o comandante-líder da operação Narongsak Osatanakorn - o elefante é o símbolo da província de Chiang Rai e o facto de ser branco significa, segundo o autor, a raridade das suas capacidades de comando e liderança.
Os javalis - “wild boars” é o nome da equipa - são naturalmente os jovens futebolistas e o seu treinador, enquanto que o cavalo branco representa todos os voluntários envolvidos.
As focas representam os Navy Seals tailandeses que coordenam a operação e as rãs os mergulhadores tailandeses que estão envolvidos no salvamento.
O leão representa os mergulhadores ingleses, o canguru os australianos, o panda os chineses, o grou os japoneses e o alce os suecos. O tigre representa os birmaneses e o elefante castanho os especialistas de Laos, representando os cães a polícia e o Iron Man, Elon Musk.
Os pássaros que voam contra a corrente representam os meios de comunicação social e bloggers tailandeses que têm vindo a criticar a operação.

domingo, 8 de julho de 2018

TANTOS POR TÃO POUCOS

Base: Infografia The Guardian
Os trabalhos de salvamento das 12 crianças e um adulto - uma equipa de futebol e o seu treinador - que se está realizar na Tailândia, na gruta de Tham Luang, tem-se revestido de aspectos extraordinários. O principal dos quais é o da solidariedade - centenas e centenas de pessoas com as mais variadas origens e conhecimentos tem dito presente. A transformação desses conhecimentos em competências - incluindo as possíveis para os jovens que se encontram no fundo da gruta - tem sido uma notável demonstração de organização sujeita à determinação do primeiro momento: salvar a equipa!

A tarefa de salvamento, pelas notícias que circulam, não tem sido nada fácil quer pela situação encontrada, quer ainda pelo provável aumento do volume das águas que as chuvas da monção provocarão, mostra-se de uma enorme complexidade na articulação das diversas partes e nas decisões a tomar. Um objectivo claro e uma estratégia montada em diversas e diferentes acções comandadas por alguém que tem no centro de comando os elementos que permitem estabelecer os níveis de risco, hierarquizar processos e decidir em conformidade, determinam cada uma das acções. Terminada a operação, este será um caso de estudo de comando e decisão - para que se possam reconhecer os métodos de um processo que, com sucesso visível, juntou profissionais de formações diversas, experiências distintas e capacidades múltiplas.

Serem membros de uma equipa desportiva também não é, como já diversas pessoas mais atentas e conhecedoras lembraram, despiciendo: habituados à disciplina, ao rigor dos treinos e dos jogos, a dependerem uns dos outros sem que ninguém se possa julgar mais importante que qualquer dos companheiros, são factores que têm ajudado, com certeza, a manter a resiliência de que têm dado provas. A capacidade do treinador - a quem os pais dos pequenos futebolistas disseram para não se culpabilizar -  em garantir a coesão de todos os elementos também não será factor de somenos importância.

O final da missão de salvamento, como afirma Steve Whitlock, um experiente socorrista em grutas, só estará terminada quando toda a gente, incluindo socorristas, estiverem fora da gruta. O que significará ainda muitas horas de trabalho, de atenção, de decisões e de coragem.

Neste enorme esforço, nesta verdadeira guerra contra a água, a alegria do salvamento de todos será a maior compensação e melhor homenagem possível para a morte do mergulhador - um antigo membro da elite de mergulhadores tailandeses e um disponível e solidário voluntário para as operações na gruta - Saman Gunan.

domingo, 28 de janeiro de 2018

EDMUNDO PEDRO (1918~2018)

A dez meses de chegar aos cem anos - a última vez que falámos apostámos que lá chegaria - faleceu o meu Amigo Edmundo Pedro. E desta aposta perdida fica-me o misto de tristeza e de alegria. Tristeza por ter visto partir uma pessoa que, como os heróis ficcionais, nunca nos deveria deixar; alegria por ter podido conhecê-lo e participar das suas ideias e das recordações de diversas situações que viveu - o prazer que me deu a leitura da versão inicial, ainda manuscrita, de que fez questão de me dar a ler, do seu texto sobre o assalto ao quartel de Beja... Ainda hoje não percebo porque não há um filme sobre aquela acção que, pela sua pena, transmitia a realidade do país: o romantismo amadorístico, cheio de uma coragem capaz de não deixar que algum obstáculo atrapalhasse o objectivo a que se tinha proposto demonstrado por um grupo de resistentes antifascistas a quem faltou sempre a coragem de outros para poder cumprir a missão que lhes norteava a vida; um regime que, impondo o medo, não abria portas fora do seu limitado mundo de interesses.
Ir parar ao Tarrafal, o "campo da morte lenta", com 17 anos e aí passar 9 anos e nunca desistir do projecto da insurreição nacional derrubador do regime facista de Salazar demonstra bem a fibra de que era constituído este querido Amigo. Conhecer a sua vida percorrendo as linhas das suas Memórias é descobrir um herói de carne e osso, de simpatia irradiante, de força moral extrema que será o mais próximo que humanamente se pode conseguir dos super-heróis que desenham os sonhos juvenis da mente de cada um de nós. Homem de enorme firmeza de carácter, tinha uma noção muito clara da lealdade e da decência - reconheça-se com admiração (e pedido público de desculpas!) o seu comportamento no famigerado “caso das armas” que lhe custou, em 1978, seis meses de prisão: que nunca tinha falado perante a polícia e que não se implica alguém que desempenha as funções de Presidente da República (Eanes), foram as explicações, décadas mais tarde, para o seu silêncio.
Edmundo Pedro era uma personagem única!
E por ser único não precisa da preguiça dos copistas para aumentarem incorrectamente a sua biografia que tem, na sua realidade própria, o mais que suficiente para merecer o respeito de Portugal. Edmundo Pedro - sendo um histórico do Partido Socialista - não precisa de ser dado como seu fundador - em cuja lista não se encontra o seu nome - para se reconhecer a importância da sua participação na vida do Partido Socialista enquanto militante, dirigente ou deputado: esteve sempre do lado da justiça, do lado dos mais fracos, do lado da Democracia e, acima de tudo, do lado da Liberdade.
Cito, do prefácio do seu Memórias I, Mário Soares: “Após o 25 de Abril de 1974, ao contrário do seu amigo Fernando Piteira Santos, Edmundo Pedro, entraria no Partido Socialista. Num encontro casual que tivemos, em Setembro de 1973, no aeroporto de Barajas, estando eu já no exílio e de regresso do Chile, de Allende, anunciou-me a sua vontade de se inscrever no PS, que acabava de ser formado na clandestinidade, na Alemanha. Mas essa vontade não chegou a concretizar-se formalmente. Só viria a sê-lo depois do 25 de Abril. […]".
A memória de Edmundo Pedro, pelo que representa para todos nós que vivemos em Democracia, não merece distrações ou desplicências. A extraordinária vida deste homem exige o respeito pelo rigor histórico dos factos.

Ver aqui texto escrito no seu 99º aniversário
...
[pelo respeito e amizade que tenho por Edmundo Pedro vou ter uma enorme dificuldade em apagar o seu nome e número de telefone do meu telemóvel...]

quarta-feira, 8 de novembro de 2017

AO EDMUNDO PEDRO COM AMIZADE, RESPEITO E ADMIRAÇÃO


O Edmundo Pedro - de quem tenho a sorte de ser Amigo - faz hoje, 8 de Novembro, 99 anos de idade. Nasceu em 1918, seis anos antes do nascimento dos meus pais. Uma vida enorme, na longevidade e no carácter.
Quem conhecer a vida do Edmundo reconhecerá que estamos em presença de alguém muito especial. Um exemplo demonstrativo - como ilustrava a cantiga de Zeca Afonso - de alguém sempre capaz de dizer não! e ser capaz de resistir com a força de carácter da convicção.
O que passou, no Tarrafal - o campo salazarista da morte lenta onde esteve preso quase criança - ou nas prisões por que passou, fazem dele um homem notável cuja história deveria ser conhecida e contada nas escolas. Para que o seu exemplo não se perca e para que o seu exemplo seja suporte de esperança de situações que, embora se espere que não tenhamos com que nos confrontar nunca mais em Portugal, percorrem o Mundo diariamente.
Ler os livros - a colecção das Memórias é um bom exemplo - que escreveu dão alguma ideia do que foi a sua vida e das suas lutas  - penso sempre, num misto d admiração e respeito: como foi possível resistir? - mas nada chega a ouvi-lo falar a contar o que viveu - lembro-me sempre da descrição do assalto ao quartel de Beja e de como daria um filme extraordinário se feito com a visão que ele nos transmite, transformando o risco de vida da luta antifascista num momento de extraordinário humor.
Ter a possibilidade de estar com ele é ouvir a lucidez da análise política sobre o Mundo actual e sobre a história do Mundo que percorreu. Nomeadamente da vida do PCP a que pertenceu e de onde saiu por questões de princípio. Estar com ele garante uma aula viva sobre o que é Portugal e como se chegou ao que ele é hoje desde os quase primórdios da República.
Caro Edmundo, o teu exemplo de resistência alicerçado nos valores e princípios que traduzem a exigência de uma vida colectiva livre e mais solidária, democrática e respeitadora dos valores e direitos humanos incita a que não desistamos de lutar pela melhoria das condições de vida dos mais fracos e socialmente desprotegidos.
Não esquecerei nunca as lições de vida que me foste ensinando e, como combinamos ao telefone,  cá estaremos para a tua festa dos 100 anos!
Um enorme e querido abraço de parabéns, Amigo!

quarta-feira, 12 de julho de 2017

BRADLEY-DEFOE UMA COMOVENTE DESPEDIDA

Foi com muita tristeza e comoção que soube da morte do pequeno - 6 anos - Bradley Lowery que foi diagnosticado com um cancro terminal. Adepto do clube inglês Sunderland, travou-se de amizade com o jogador de futebol do clube, Jermain Defoe, que teve a atenção e o carinho de lhe corresponder genuinamente. Formaram um parelha exemplar e enternecedora.
Vendo as fotografias e sabendo do que se ia passando, tenho a certeza que o futebolista Defoe conseguiu dar ao pequeno Bradley momentos de grande felicidade.
Com muito respeito e pesar quer pelo pequeno Bradley quer pelo grande Defoe, deixo o seu comovente texto de despedida.
Alguns adeptos do Sunderland lançaram uma petição - embora não sendo sócio do Sunderland assinei a petição (clique aqui) porque a apoio absolutamente - para que seja dado o nome de Bradley Lowery a uma das bancadas do estádio do Sunderland. Mais propriamente à bancada sul que hoje tem a designação de East Stand. A mudança do nome significará que os adeptos do Sunderland reconhecem esta amizade entre Bradley e Defoe como uma expressão exemplar de afecto e esperança que deve perdurar na memória do tempo.
É um gesto que espero se concretize para mostrar ao mundo que o Desporto não é, ao contrário do que vemos espelhado todos os dias - por gente que, não sendo dele, se serve dele - um espaço de luta estúpida e insultuosa, mas um espaço de solidariedade, companheirismo, respeito e amizade. E esta bancada assim o lembrará.

terça-feira, 20 de junho de 2017

O FOGO

Pedro Brás, Facebook
As minhas profundas condolências aos familiares das pessoas falecidas nos fogos dos últimos dias. A minha solidariedade fraternal a todos os que no terreno combatem - com notável coragem, persistência e assertividade - as chamas em condições de enorme dificuldade.
Por respeito aos mortos e aos seus familiares não dou agora conta do que penso e daquilo que me indigna na repetição constante, ano após ano, dos mesmos argumentos que, afinal, não são ouvidos por quem de direito. Falta de coragem, estupidez pura, elevada incompetência ou interesses instalados estarão, cada um por si ou por todos ao molhe, na causa da incapacidade ou de erros cometidos. Tudo apesar do esforço de muitos desperdiçado na ineficácia da preparação ou da prevenção.
Gostaria que pela memória dos mortos, das suas famílias, dos feridos e daqueles que tudo ou muito perderam que houvesse a dignidade de analisar, discutir e planear um futuro de intervenções sobre incêndios mais eficaz. Com seriedade e espírito de missão. 
É preciso compreender para tomar as decisões acertadas para farantir um futuro mais seguro. Porque o clima ou a demografia não vão mudar, mas vão acentuar as condições actuais.

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

PALMAS PARA GUTERRES

Pela segunda vez na vida vi com muita emoção uma sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas. A primeira foi quando Costa Gomes, então Presidente da República, discursou e pude ver - graças ao 25 de Abril - Portugal aceite no concerto das Nações enquanto membro de plena igualdade. Nessa altura, como hoje, senti um enorme orgulho carregado de enorme emoção.

Hoje, telever António Guterres ser aclamado enquanto novo Secretário-Geral, telever a salva de palmas com que foi brindado quando da sua entrada ou nas interrupções ao seu - excelente, diga-se - discurso, foi de um orgulho muito grande.
Esta eleição de Guterres representa um novo ciclo para as Nações Unidas: pela primeira vez a eleição foi realizada de acordo com os princípios da transparência. Quem quis soube ao que ia cada um dos candidatos e Guterres foi exemplar na construção da sua candidatura.
O seu anterior exercício de Comissário para os Refugiados dá-nos a certeza das suas capacidades e da tenacidade (ou resiliência) que porá no exercício deste cargo impossível como lembrou a Embaixadora americana. E também a certeza que não o exercerá sentado mas nos sítios necessários à sua influência. Em combate pelos princípios que enunciou.
O humanista Guterres tem as condições e convicções para que nos possamos vir a orgulhar do seu mandato. E uma certeza podemos desde já avançar: o seu exercício como o seu final serão de uma clareza de prestação de serviço a toda a prova. E ficaremos ainda mais orgulhosos com o legado transformador que este português deixará nas Nações Unidas.
Uma salva de palmas!

quarta-feira, 3 de agosto de 2016

ESTÁ ERRADO! COMPONHA-SE!


@s noss@s menin@s são piores do que @s menin@s dos outros? Serão?!
Alguma coisa se há-de passar pelas más notas que @s noss@s menin@s têm a Matemática e Português. Todos burr@s?! - palavra que aliás não se justifica porque o animal é inteligente.
Então, se @s noss@s menin@s são tão burr@s ou inteligentes como @s outr@s, porque terão as más notas que têm? Porque não estudam nada? Ou porque não percebem o que lhes ensinam por desajustamento de programas ou erro de métodos de ensino?
Seja como for, manda a obrigação de serviço público de se adaptar o sistema à realidade existente. Isto é, que se faça um esforço para que se encontrem os processos que permitam que @s alun@s aprendam as bases que lhes permitam contar e comunicar eficientemente. Ou seja: que os programas sejam adequados e que o processo e método de ensino sejam também adequados e atraentes. 
E adequar significa encontrar formas que aproximem a linguagem de alunos e professores, permitindo,portanto, que se entendam.
É urgente que a transformação se faça - a Matemática e o Português são ferramentas fundamentais para uma integração positiva na sociedade.
E como @s noss@s menin@s são iguais a@s outr@as menin@s do resto do mundo não convém dar-lhes logo de início uma imensa desvantagem.

(EPÍLOGO COM LEMBRANÇAS DE MONIZ PEREIRA (1921/2016): Acreditando que os noss@s atletas eram tão boas/bons como @s estrangeir@s desde que tivessem as mesmas condições de treino, Moniz Pereira convenceu o poder político pós 25 de Abril a conceder às/aos atletas com melhores resultados e maiores capacidades o tempo disponível necessário para poderem treinar bi-diariamente. Introduzindo  as práticas necessárias ao Desporto de Rendimento, Moniz Pereira aproximou @s noss@s atletas d@s adversári@s e assim conquistou medalhas olímpicas, medalhas e recordes mundiais, campeonatos. Talvez @s senhor@s que mandam nestas coisas chamadas da Educação obtivessem melhores resultados se seguissem a proposta de Moniz Pereira: garantir que @s noss@s menin@s têm as mesmas condições do que @s menin@s dos outros lados. Porque valem tod@s o mesmo!).

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Prémio Universidade de Lisboa 2015, Nuno Teotónio Pereira




Ontem, 15 de Outubro, na cerimónia solene de Abertura do Ano Académico 2015-2016, foi entregue o Prémio Universidade de Lisboa 2015 a Nuno Teotónio Pereira, arquitecto e cidadão exemplar.
Recebeu o prémio a sua mulher, Irene Buarque, e fez o elogio Nuno Portas que, de forma emocionada, relembrou os tempos comuns.
Homenagem justa com a Universidade de Lisboa a mostrar-se atenta à envolvente externa à Academia onde a vida se move e é a essência do conhecimento, da investigação e da teorização.
Para conhecer a decisão do júri, clique aqui

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Membro Honorário da Ordem dos Arquitectos



foto de Luis Rocha

Por casualidade poucos dias depois da Sessão Evocativa que fizemos ao Vasco Massapina (209/57) fui convidado pelo Conselho Directivo Nacional da Ordem dos Arquitectos para fazer o seu elogio na cerimónia de entrega da distinção de Membro Honorário que, a título póstumo, lhe foi atribuída. No discurso de agradecimento de outro dos distinguidos - Manuel Correia Fernandes, actual Vereador do Urbanismo do Município do Porto - disse palavras muito simpáticas e significativas sobre o Vasco. Como membro (desde 2008) do Conselho Nacional de Delegados da Ordem tive lugar na Mesa da Cerimónia e esta foi a minha intervenção:

"Senhor Presidente da Ordem dos Arquitectos, João Santa-Rita
Senhores Membros Honorários da Ordem dos Arquitectos
Colegas Arquitectas e Arquitectos presentes
Minhas Senhoras e meus Senhores, Isabel, Pedro
Conheci o Vasco Massapina há cinquenta e sete anos e alguns dias mais - foi em Outubro de 1957 na camarata da 1ª companhia do Colégio Militar. Como lembra nas palavras que dedica, como refere, a este "seu amigo de sempre" no seu livro "O Risco do Arquitecto, Interesse Público e Autonomia da Profissão", fomos colegas em vários caminhos e encruzilhadas. E por esses caminhos e encruzilhadas sempre o reconheci como homem de carácter, culto, inteligente, amigo do seu amigo, solidário, camarada, disponível e coerente entre o dizer e o fazer. Um bom amigo de quem tenho saudades, um bom colega de profissão com quem partilhei as paixões que nos fazem Arquitectos.
E é por isso, por ser seu amigo de sempre e ter, com ele, partilhado caminhos e encruzilhadas que me sinto particularmente honrado com a possibilidade que me é dada de fazer o seu elogio nesta sessão de atribuição da distinção de Membro Honorário da Ordem dos Arquitectos.
Arquitecto desde 1972 pela Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, Vasco Massapina é membro nº 648 desta Casa e nº 45 do Colégio de Especialidade de Urbanismo. Foi Presidente do Conselho Directivo Regional Sul da Associação dos Arquitectos Portugueses entre 1993 e 1995 e Vice-Presidente do Conselho Directivo Nacional da Ordem entre 1996 e 1998. Foi ainda membro, com o número 46, da Associação dos Urbanistas Portugueses da qual foi vice-presidente e é Membro Honorário.
Em 1981 fundou com o seu irmão João Vicente, arquitecto, e a mulher, escultora, Isabel Lhansol, o "Atelier Cidade Aberta, Arquitectura, Planeamento e Artes Plásticas" por onde passaram amigos como Jorge Costa Martins, Jorge Kol de Carvalho e Luís Manuel Pereira e que se continuou com os seus filhos arquitectos João e Bárbara e o genro, também arquitecto, Pedro Vaz.
Funcionário público da Direcção Geral dos Serviços de Urbanização desde 1972, atinge em 1992, por concurso e na categoria de "ordenamento do território", a categoria de Conselheiro do Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes onde preside à 3ª secção  "Urbanismo e Edifícios". Foi também Vogal do Conselho Consultivo do Instituto Português do Património Arquitectónico, IPPAR, onde, já depois de reformado, continuou, em regime pró-bono, a prestar serviço.
Foi ainda membro do Bureau executivo da Federação Internacional de Urbanismo e Ordenamento do Território e, em representação do Governo português de então, Perito do Comité Consultivo para a Formação no Domínio da Arquitectura na União Europeia. Recebeu a Medalha do Colégio Oficial de Arquitectos de Madrid e foi Académico Correspondente da Academia Nacional de Belas Artes.
Como professor convidado da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa leccionou de 1997 a 2002 a cadeira de Urbanismo II, deixando aí uma reconhecida marca qualitativa muito própria, 
Integrou ainda a Comissão Executiva dos Banhos de S.Paulo que dirigiu o processo de instalação da sede nacional no edifício dos Banhos de S.Paulo, inaugurada, como nos diz a memória e lembra a placa do átrio de entrada do edifício, em 21 de Novembro de 1994 - passam agora vinte anos.
Deixou, entre outros, dois planos marcantes - o "Plano de Salvaguarda de Beja" e o "Estudo de Preservação e Renovação Urbana de Ponte de Lima" - que, hoje ainda, quando lidos ou estudados proporcionam valiosos ensinamentos na arte de bem fazer.
Se ainda estivesse entre nós, Vasco Massapina - pelo que afirmou e lutou em nome da Arquitectura e dos Arquitectos, pelos valores que defendeu numa vida plena - estaria, posso afirmá-lo com convicção, na primeira-linha desta luta que os Arquitectos hoje travam contra o jogo de interesses, contra a iliteracia e contra a indigência cultural que representam as Propostas de Lei Nº 226/XII e Nº 227/XII que o Governo pretende fazer aprovar.
Estaria o Vasco Massapina, como tantos outros nesta sala e como sempre se mostrou, disponível para dar o seu melhor neste combate que, ultrapassando a mera visão corporativa, se afirma contra o abuso daqueles que confundem arquitectura com construção, desenho com ocupação espacial ou urbano com aglomeração. 
Ao atribuir ao Arquitecto Vasco Massapina a distinção de Membro Honorário da Ordem dos Arquitectos, o Conselho Directivo Nacional da Ordem honra a memória dos que, ao longos dos anos, construíram e pertencem a esta nossa Casa. 

João Paulo Bessa
Ordem dos Arquitectos, 30 de Outubro de 2014"

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Evocação do Vasco Massapina

Foto de Silva Alves
Organizada pela Família e com o apoio da Ordem dos Arquitectos realizou-se na sua Sede dos Banhos de S.Paulo uma Sessão Evocativa do Vasco Massapina (1947-2012). Numa sessão muito participada - Auditório Nuno Teotónio Pereira cheio de Amigos, Arquitectos e Ex-alunos do Colégio Militar - intervieram o Presidente da Ordem dos Arquitectos, João Santa-Rita, Elísio Summavielle, Fernando Pinto, Helena Souto, João Soares, Luis Carvalho, Luis Pedro Cerqueira, Pedro Guimarães, Pedro Vaz - em representação da família - Rui Rasquilho e eu próprio.
Coube-me nesta evocação, o nosso tempo comum com início em 1957 no Colégio Militar. Este foi o meu texto:

Exmas Senhoras e Senhores. Amigos do Vasco
A memória tem uma enorme vantagem: enquanto existe não deixa esquecer. E nós, camaradas do 209 de 1957, colegas do arquitecto Vasco Massapina, amigos do Vasco, não o esqueceremos. Generoso, amigo do seu amigo, diligente, inteligente, culto e disponível temo-lo hoje, como o teremos amanhã, na nossa memória. Com saudade feita de longa amizade.
Conhecemo-nos já vão 57 anos e dez dias...
... nesta camarata da 1ª Companhia onde, no dia da entrada, fazíamos a cama pela primeira vez. Separavam-nos duas, três camas; ficámos na mesma turma. 
Começava assim o ano de "Ratas" numa vida de fardas, de formaturas, de paradas militares. De continências.
Iniciávamos então a construção de uma marca indelével de uma forma de ser, de uma forma de encarar a vida, de uma forma de estar no mundo. De uma solidariedade chamada camaradagem assente em valores tão claros como simples: não deixar ninguém para trás, nunca ser canalha, respeitar os valores da honra, da dignidade e da decência. Olharmo-nos de frente e assumirmos as nossas responsabilidades.
O Vasco sempre gostou de cumprir. E fazia-o de forma inteligente e imaginativa: por "ordem de serviço" éramos obrigados a escrever todas as quartas-feiras para a família. Uma chumbada, uma dor de cabeça na invenção do nada para dizer. Excepto para o Vasco: nas cartas que escrevia relatava os nossos jogos de futebol do campeonato inter-turmas para terminar a missão com um definitivo não tenho mais nada para contar. 
O Vasco gostava de se fardar bem, de aparecer de botas altas de equitação. Sempre impecavelmente alinhado - o Martiniano Gonçalves lembra que gostava de lhe cravar cigarros porque eram os únicos que saíam direitos dos bolsos - tinha uma postura permanente de elegância. Que lhe ficou para a vida.
No Desporto que o Colégio tornava obrigatório: a esgrima, o tiro, a equitação, a ginástica, o atletismo - levando-nos à prática do Pentatlo Moderno de que não conhecíamos existência, o Vasco, como tantos de nós, ainda fazia questão de pertencer às equipas representativas colegiais que disputavam os campeonatos da salazarista Mocidade Portuguesa.
Também gostava muito de cavalos e embora - por evidente estupidez nas prioridades do então responsável - não tenha feito parte da Escolta a Cavalo colegial, montava bem e tinha artes - como mais ninguém, aliás - de conseguir, nas diversas vezes que qualquer castigo o proibia de saída ao fim-de-semana,  o direito a um "cavalo de serviço". E então, com o Francisco Cardoso de Menezes a cronometrar, fazia da pista de atletismo o hipódromo de todos os sonhos.
De mais aulas, de menos aulas, mais formaturas e mais paradas, borgas e desatinos, chegámos ao fim do curso marcado pelo Baile dos Finalistas. Aos próximos avisou: deixem-se de palermices, nada de parvoíces, hoje vem cá a Isabel!
Gostava de fardas o Vasco, pensou em ir para a Marinha - farda azul no inverno, farda branca no verão - mas a Isabel, a caminho das Belas-Artes, levou-o, pelo amor de uma vida e para sorte nossa, a preferir Arquitectura.
Acabado o 7º ano - onde ambos pertencemos, no fundo da hierarquia, ao notável clube dos "furriéis" - o Vasco manteve sempre uma enorme e apaixonada relação com o Colégio e a nossa Associação de Antigos Alunos. Muitas vezes passava lá as manhãs de sábado a ver, orgulhoso, os netos nos treinos do Pentatlo.
Ao desafio do então Director colegial, Raúl Passos, para projectar um novo e complexo pavilhão desportivo que respondesse às actuais necessidades da formação desportiva de excelência, organizámos uma equipa peculiar: só podiam participar profissionais ex-alunos do nosso curso e nossos filhos. A nós juntaram-se o Adão da Fonseca e o Santos Coelho e os nossos filhos, o João Massapina, arquitecto e o Raul Bessa, engenheiro. E com a generosidade que punha em tudo que fazia, ao pró-bono dos projectistas, juntou o serviço do seu gabinete. Projecto que está pronto e à espera da inteligência de melhores dias para ver a primeira pedra.
E dessa sua permanente disponibilidade ainda resultaram, a pedido da nossa Associação, o anteprojecto do Colégio Militar de Timor e a reabilitação do Quartel da Formação para, a exemplo das "meninas de Odivelas", construir o nosso lar social.
Durante anos rimos - como gozávamos com o ar jamesbond de o "risco ser a nossa profissão" - e tivemos, longas, divertidas e interessantes conversas sobre políticas, politiquices, exercício da profissão, arquitecturas, urbanismo e, principalmente, sobre a mútua paixão da Cidade - essa obra-prima da capacidade do ser humano. Sempre disponível para a intervenção cívica e profissional, participamos, juntos, em muita actividade.
Por seu desafio e insistência - "a Ordem precisa da tua experiência", dizia - tenho sido nos últimos anos membro do Conselho Nacional de Delegados desta casa.
Gostaria assim por tudo o que nos liga que nós, camaradas do 209 de 57, trouxéssemos da nossa outra casa que será sempre do Vasco e para esta outra casa onde o Vasco  é membro honorário, a nossa saudação tradicional:
Senhores ex-alunos, de pé!
Pelo 209 de 57, pelo arquitecto Vasco Massapina, pelo nosso amigo Vasco: Zacatráz! Zacatráz! Zacatráz!
Zacatráz! Zacatráz! Zacatráz!
Zacatráz! Zacatráz! Zacatráz!
Ala, Ala! Arriba
Ala, Ala! Arriba
Allez, Allez à votre santé!


  

  


quarta-feira, 15 de maio de 2013

Vasco Massapina

O Vasco Massapina faria hoje 66 anos. Partiu cedo de mais e deixa-nos o vazio da sua amizade. Em memória deixo o texto que escrevi e que foi recentemente publicado no nº 190 da revista ZacatraZ da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar.
VASCO MASSAPINA, O PESCADA
Pescada. Pescada?! Mas quem se lembraria de pôr esta alcunha a alguém. Porque antes de o ser já o tinha sido? Reincarnações? Não, não me parece e só parece haver uma explicação: era do antecessor. Está visto, a alcunha era do antecessor. Mas o 209 de 1957, o nosso Vasco não se importava com ela, achava-lhe até uma certa graça. E assim ficou, até hoje: Pescada.
Entrámos ambos em 57 para a 1ª do Guedes Florista e ficámos na mesma turma. Na sala de aula, uma carteira nos separava; na camarata, duas, três camas nos separavam. Fizemos a vida sempre próximos: Colégio, Arquitectura, vidas cívicas, confronto de ideias e opiniões, risos e gargalhadas. E indignações várias!
Há pouco tempo deu-me uma carta, encontrada no fundo da gaveta, que escrevera à madrinha sobre as memoráveis futeboladas que fazíamos no pelado da 1ª ou nos gerais. Falava dos golos - deveria ser do tempo em que éramos obrigados a escrever a alguém à quarta-feira - que eu tinha marcado e que, dizia, de outra forma não teríamos chegado à vitória. Terminava com um não tenho mais nada para dizer de missão cumprida. Era assim, cumpridor. Era preciso fazer, fazia-se. Falando dos amigos, a gabá-los.
Nenhum de nós era algum modelo de bom comportamento. A maior diferença estaria, talvez, que o Vasco gostava de fardar-se bem - o Nano lembra que no bolso do sempre elegante blusão nunca faltavam cigarros - e de usar botas altas e, eu, tinha uma razoável indiferença sobre essa componente de atavio castrense. Mas ambos gostávamos de montar e de cavalos. Logo que pude concorri à Escolta e fiquei porque a preocupação de quem mandava era mais a do “estar a cavalo” do que a de comportamento. O Vasco, mais tarde, também concorreu - um outro qualquer exigia, mais do que o “estar a cavalo”, o bom comportamento. E o senhor aluno, o Pescada, o 209, o Massapina, não tinha o Bom a comportamento necessário: não entrou e essa tristeza ficou-lhe pela vida. E só me perdoou porque era meu amigo - em grandes gargalhadas comentava: este gajo foi da Escolta e eu, por mau comportamento, não fui. Já viram isto?
Aventuras colegiais, muitas. Do início até ao posto de Furriéis com que ambos não fomos graduados - no nosso curso éramos um notável grupo de alguns quinze... Saídas nocturnas, cavanços, entrada a salto e assaltos - acho que foi na Física que foi apanhado fora de horas e de autorização.
No dia do Baile dos Finalistas apareceu-me alvoraçado: eh pá! andei por todo o lado à tua procura - tinha ido à Luz ver o Eusébio a enfiar dois na baliza do dr. Maló da Académica - tens que me safar. Que era então? Tens que “segurar” a Paula - morena, volumosa de corpo roliço, irmã da namorada do Gil e flirt recente do Vasco - porque a Isabel também vem. Fiz o que devia e o “caso” ficou-se por ali.
E ficou-se com a Isabel, o amor da sua vida. Desde então até hoje. Acho até que foi por ela que foi cursar Arquitectura - a Isabel foi para Pintura e tudo se passava na mesma escola de Belas-Artes de Lisboa. E acho também, talvez porque ele me tenha dito ou talvez por lhe adivinhar o gosto das fardas, que foi por ela que não foi para a Marinha, vontade a que a própria Mãe não seria alheia. Mas a Isabel levou a melhor.
Lembrava-me sempre - e fazia questão de o lembrar a outros - a homenagem do Menau quando atravessei, fardado e pela última vez, os claustros: levantai-vos que vai ali um homem digno! Achou sempre - e dizia-o - a minha expulsão uma indecência.  Sempre amigo do seu amigo. E preocupado com injustiças. Camarada, fiável, solidário. Sempre!
Na Escola participámos numa greve que o meu curso - eu atrasei um ano graças à expulsão - levou até limite dos exames corridos a zero. Foram meses de RGA, de bota abaixo, de exigências, de “enterro da Escola”. No pós-25 de Abril entrámos na luta contra a existência de “patrões” no Sindicato dos Arquitectos - sindicato é para empregados! Mais tarde ajudou à construção da Associação dos Arquitectos Portugueses onde foi Presidente do Conselho Directivo Regional do Sul e foi ainda Vice-Presidente do Conselho Directivo Nacional da Ordem dos Arquitectos. Por sua causa - precisámos da tua experiência, disse-me a convencer - ainda sou hoje membro dos seus corpos sociais!
Como profissional o Vasco sempre se preocupou com as cidades - lembro-me de uma interessante tese, numa visão inovadora da extensão do conceito cidade e dos seus serviços e como proposta de desenvolvimento urbano - que defendia que o centro de Lisboa se situava no meio do Tejo. E realizou, nessa paixão do construir cidade, dois trabalhos inovadores: o Plano de Beja e o Plano de Ponte de Lima que ainda hoje são lidos como marcos da intervenção urbana portuguesa. E fez também, começando em associação com o Olhos - outro arquitecto “menino da Luz” do nosso curso - a que se juntava a mulher Isabel, muita arquitectura em gabinete próprio a que acrescentou, logo que possível, os filhos também arquitectos - a Bárbara e o João. E sobre isso trocávamos opiniões e chamávamo-nos mutuamente a atenção para coisas relevantes da arte. E o gozo que nos dava acertarmos nas mesmas coisas.
Era do Belenenses e fazia parte daquele pequeno grupo de espectadores que, fielmente, seguia , no estádio, a sua equipa de futebol. Tinha pena da realidade da equipa e de não poder ir com os amigos à bola - dadas as circunstâncias, nenhum de nós se mostrava muito interessado. E ele lá ia, muitas vezes com os netos, a deixar correr a marca pastel no sangue.
Pouco depois de termos ido falar - o meu cunhado Vasco Coucello fez-nos companhia - aos futuros graduados que ficaram agradavelmente admirados com as estórias que nos ouviram, o Raul Passos, então Director do Colégio, desafiou-nos para realizarmos o projecto do novo Pavilhão. Aceitámos e pusemo-nos uma condição: a equipa projectista seria formada com ex-alunos entrados em 57 e com os seus filhos: o Adão da Fonseca, o Santos Coelho, nós os dois e os nossos filhos, o João e o Raul. Formámos uma parceria excelente a que se acrescenta o Nano, então Presidente da Associação, que nos ajudava nas relações entre partes. O Vasco, como sempre, pôs toda a energia, o tempo e o espaço do seu gabinete ao serviço deste projecto para o nosso Colégio. E o projecto - bom, diga-se - aí está, pronto a começar a construir depois das medições e orçamento feitos, entretanto, pela Engenharia Militar.
Com a paixão que punha nas coisas que diziam respeito ao Colégio - passava aqui manhãs de sábado com a desculpa de ver os netos no Pentatlo Moderno - lançou o princípio do projecto de reconversão da Formação para, seguindo o exemplo das Meninas de Odivelas, também criarmos ali o nosso Lar - e conseguiu, passo sempre delicado, a aprovação do IPPAR para as novas volumetrias. A pedido da nossa  Associação ainda fez o anteprojecto para um Colégio Militar em Timor - projecto interessante com réplica contemporânea e adequada dos nossos claustros - e que foi aprovado pelo agora Presidente da Républica timorense ao tempo de Chefe do Estado-Maior General.
Ocupou postos de relevo, foi professor e, entre diversos escritos, deixou-nos um livro com o sugestivo título de “O Risco do Arquitecto, Interesse Público e Autonomia da Profissão” - e como ríamos da ideia de “o risco” ser a nossa profissão. Nesta discussão actual sobre Arquitectura, Arquitectos, Actos Próprios da Profissão, desemprego por falta de projecto ou saídas profissionais, deixou-me um texto, bem recente, a abrir portas para o futuro da profissão. Generoso como sempre. Sem desistências. Amigo para sempre. 
O tempo acabou-se para o Pescada e eu tenho saudades.
João Paulo Bessa (200/57)

Ver aqui outro texto sobre o Vasco

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