domingo, 9 de dezembro de 2012

Vasco Massapina (1947-2012)

Morreu o Vasco Massapina. Morreu há pouco e soube-o há pouco.

Morreu um querido amigo - "para mim és meu irmão", dizia-me - e eu estou magoado, muito magoado. Com as escolhas da vida. E revoltado com aquilo que já não tem remédio.

Tivemos, temos!, inúmeras cumplicidades começadas há mais de meio-século no Colégio Militar: de gozo, de políticas, de política profissional, da política, de zacatrazes...ele é o 209 de 57. Por seu desafio e insistência, sou hoje membro do Conselho Nacional de Delegados da Ordem dos Arquitectos - "era bom que entrasses na lista, a Ordem precisa da tua experiência", disse-me. Disponível como sempre, deu-me, a cada pedido, a sua opinião sobre qualquer questão das muitas complexidades do exercício da profissão. Tive-a sempre ponderada, cuidada e inteligente - em ajudas empenhadas na melhoria da condição de prestação profissional dos Arquitectos e na exigência da Arquitectura.


Falamos longos tempos sempre ganhos da paixão Cidade - tenho sempre presente a sua tese do Tejo como centro da enorme Lisboa que queria ordenada, confortável e amigável - das políticas de cidade, das cidades generosas, da Arquitectura, das arquitecturas que gostávamos e que detestávamos, ríamos vezes sem conta entre um humor cáustico e só a vontade de rir. Detestávamos muitas mesmas coisas e múltiplos canalhas e canalhices. Ele detestava a indecência e respeitava - coisas que nos ficam do Colégio - aqueles que era suposto terem responsabilidades e serem decentes - dava-lhes sempre o seu melhor benefício da dúvida. E isso, nas descobertas da vida, aumentava-lhe a desilusão.

Do tempo do Colégio temos memórias memoráveis. Notáveis. Apesar disto e daquilo - não fomos dos "meninos da Luz" mais bem comportadinhos que por lá passaram... - gostámos os dois do tempo que lá passámos. O Vasco sempre gostou muito de cavalos - galopava em voltas à pista de atletismo com cronometragem do Pica - e teve sempre o desgosto de, ao contrário de mim, não ter feito parte da Escolta a Cavalo por causa das sofríveis notas de comportamento. "Como é que tu conseguiste?!", "Porque só me portei mal depois de ter entrado", respondia-lhe e ríamos como se tivesse sido um golpe genial. Como se os tivessemos fintado. E quantas fintas lhes fizemos... à cãozoada, à sargentada. Bons tempos que recordávamos com gosto e gozo. O Vasco gosta muito do Colégio! E tinha particular gozo em ir ao Colégio com netos, ao sábado de manhã, para os treinos de pentatlo - "a minha neta pode vir a ser grande atleta, é uma ganhadora", dizia-me com ar babado de avô orgulhoso.

Participei na sua equipa que fez o projecto - um desafio do Raul Passos então general director - para o novo pavilhão desportivo do Colégio. A regra que impusemos foi simples: aqui só entram ex-alunos (de preferência do nosso curso) e filhos de ex-alunos. E assim o projecto foi feito com os nossos filhos, o João (arquitecto) e o Raul (engenheiro) e mais uma série de amigos e camaradas - o Adão, o Amarela e outros mais novos - numa equipa de primeira. Foi um empenho sério, pró-bono e com um único objectivo: possibilitar ao Colégio um instrumento de grande qualidade num edifício capaz de significar o "nosso" espaço. Ficou um bom projecto que, um dia, espero que seja construído para fechar o círculo - desenho e construção - da Arquitectura.

Desde que adoeceu, bateu-se como um leão - não queria que o visitassemos, não queria que o víssemos "assim". Com pena, respeitei-lhe a vontade - fisicamente recordo-o como pretendeu, saudável.

Esteve sempre disponível para os amigos, tinha da camaradagem um conceito que ultrapassava a solidariedade. Vou sentir muito a tua falta, Meu Amigo. Zacatráz!


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