quarta-feira, 8 de outubro de 2014

5 de Outubro

Convidado pelo Presidente fui às Comemorações do Dia da República na Câmara Municipal de Lisboa. Sentado na galeria junto de outros convidados vi chegar o Primeiro-ministro que, passando-nos na frente - literalmente en passant - lançou displicente: Bom dia. Como estão? Não resisti e lancei: Mal!, enquanto que o homem se refugiava na área dos gabinetes. A lata: com ar como se nada fosse, pergunta como se fossemos todos íntimos, como estão?! E com a governação que comanda havíamos de estar como? Bem?!    
Ouvi António Costa, a propósito da necessidade de preservar a memória, exigir a volta dos feriados de 5 de Outubro e 1 de Dezembro. E prometendo que Lisboa continuará a festejar um e outro com festejos adequados. Respondeu-lhe uma enorme salva de palmas - a única da sessão.
Depois falou Cavaco Silva. E por maior respeito republicano que possa ter por um Presidente não posso deixar de lamentar o teor e o tom do seu discurso. Pretensioso e fingido a deixar, no final, uma única e possível questão: E que fez Vossa Excelência com o imenso poder de que tem desfrutado ao longo de anos para evitar os males que nos apresenta como suas preocupações?  Um homem que passou anos no poder como primeiro-ministro e agora como presidente sacode, olímpicamente, a água do capote de culpas próprias para, qual extra-terrestre recém-aterrado, desatar a malhar por tudo quanto representa a sua acção e o seu pensamento político. Quer dizer, o homem mascara-se e rejeita qualquer responsabilidade pela actual situação. Quer como Presidente da República, quer como Primeiro-Ministro. Ou seja: nada tem com isto. Chegou agora...
Quer dizer que o que disse está errado? Nem por isso, mas faltou-lhe a dignidade corajosa de dizer que era parte do estado a que as coisas chegaram - que diabo, Cavaco Silva tem ligações ao poder de maior capacidade decisória durante quase vinte anos nos últimos 34 anos.
Acabada a cerimónia saí com Eduardo Lourenço, cumprimentámos António Costa, e fomos procurar um táxi - uma trabalheira em dia de Maratona - apanhável apenas próximo da Casa dos Bicos. Na volta, já sem a ajuda da sempre estimulante conversa deste camarada do Colégio Militar, perguntei, á vista de uns quantos de passo de corrida pesado, a um polícia: a que horas passaram os primeiros atletas? Ás 11 menos um quarto, respondeu. O relógio marcava 1 menos dez...

De povo, nada. O festejo da República fez-se sem povo. A praça da ovação da República não tinha o povo republicano que a defende. A História, na distração das nossas preocupações, está a perder-se neste jogo de apagamento forçado.

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