O jantar da Mesa Dois do Procópio - habitual na época do Natal - realizou-se hoje (18) no restaurante da Ordem dos Engenheiros (nada mau, bem servido e com boa vista sobre o Eduardo VII). Momento especial de encontro de amigos de longa data. Risos, altas teorias, notícias, perspectivas, assim vai o mundo e etc. e tal. Do melhor como sempre e mantendo a tradição de tratar do mundo - já que de nós parece cada vez mais difícil. Na mesa onde fiquei - ao lado da dos senhores embaixadores e senhoras (ainda sobravam embaixadores espalhados pela sala...) - lembrei-me, a propósito de qualquer coisa, dum enorme e belíssimo verso da poesia portuguesa, o resignado "
tão fora de esperar bem" de Joam Roiz de Castelo Blanco. O João Paulo Guerra, porque o disse há anos (muitos) numa récita organizada pela Natália Correia, lembrava-se mais ao menos de todo o poema. Conseguimos, em esforço de toda a mesa, (re)compô-lo integralmente. É de uma beleza extraordinária: na métrica, no jogo de palavras, nas imagens que permite. Assim:
CANTIGA, PARTINDO-SE
Senhora partem tam tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tam tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.
Tam tristes, tam saudosos,
tam doentes da partida,
tam cansados, tam chorosos
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tam tristes os tristes
tam fora d'esperar bem,
que nunca tam tristes vistes
outros nenhuns por ninguém
Joam Roiz de Castelo Branco
Segunda metade do sec. XV
Contador de D.Afonso V