quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Néné, meu Amigo

O meu amigo Artur, num gesto de simpatia que me tocou profundamente, ofereceu-me o livro sobre o seu pai “Artur Santos Silva, uma vida pela liberdade”. Com ele vinha um cartão que dizia onde encontrarás o Néné.
Quarenta anos depois da sua morte – aos 24 anos! - o tempo atirou a violência da notícia para uma penumbra que me permitiu, diversas vezes ao longo destes anos, rir-me das lembranças que nos são comuns: as futeboladas em Miramar, as voltas em bailes de arraial em arraial com entradas de salto, jantares aqui e ali – também no Chez Lapin que inventaste, lembras-te? – e tantas vezes em Felgueiras ou nas novidades elegantes à cinema francês do Compra Bem, a promoção do volante AJ Foyt a citado filósofo no exame do 7º ano, as passagens, em fins de tarde, para flirtar com as amigas na Arcádia ou o encontro em Coimbra na festa (dura!) da revolta de 69… tantas vezes, tantos momentos...
Ao ler o livro encontrei – como me disseste, Artur – o Néné e peço licença para retirar, de uma carta do teu pai, esta lembrança de um e outro: 
"Eu sabia que tu eras corajoso e não posso esquecer-me aquele dia em que tivemos juntos aquele incidente na Polícia, em que tu, quando me viste em luta com o monstro do agente que te agredira (homem robusto que estava a levar a melhor) saltaste e o manietaste por forma a que ele gritou por socorro, chamando aqueles vis sicários que cobardemente te agrediram com barbaridade animal na minha presença. Tenho ainda nos meus ouvidos o teu grito lancinante: Você não bate no meu Pai. Terríveis horas que passámos juntos em que pensei que ias morrer.
Esta tua atitude foi das mais corajosas que jamais vi.
Ela foi bem para mim a demonstração do amor alucinado que me tinhas. Como posso jamais esquecer-te meu amor, meu grande amor de toda a minha vida. Como é possível viver a vida sem ti, encontrar nela outra coisa para além do desconforto.”
A leitura das cartas escritas ao Néné pelo pai Artur, emocionaram-me muito. Lembraram-me a realidade do luto. A dimensão da saudade. O destempo do sofrimento.

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