“O sistema está obsoleto.”, diz o presidente do Comité Olímpico de Portugal, Vicente Moura. Concordo. Está obsoleto porque é o modelo da iliteracia desportiva portuguesa aprendida na visão salazarista do “orgulhosamente sós” a que se juntou a pesporrente ideia de que “damos lições ao Mundo”. Assim, sozinhos e superiores, tratámos, ao longo de anos e anos, do nosso Desporto. Com os resultados visíveis.
Não temos, desde sempre, objectivos estratégicos claramente definidos para construir os caminhos do desenvolvimento qualitativo desportivo. Não sabemos como nos organizarmos eficazmente. Ignorámos o que se passa por outros lados do mundo e como se constroem as suas melhorias. Apesar de tudo isto e por pura (só pode ser) acumulação de ignorância, achámo-nos formidáveis. E não somos… como mostram os resultados.
Temos uma prática desportiva fracamente generalizada – basta saber o número total de atletas federados. Temos um Alto Rendimento de resultados baixos e fracos – notem-se as qualificações possíveis para Londres que se ficaram por meros 41% de modalidades presentes ou veja-se a incapacidade de aceder aos Jogos por parte das modalidades colectivas com bola ou compare-se o nível dos nossos recordes com os recordes internacionais. Dos fracos resultados internacionalmente comparados, a excepção surge de um ou outra sobredotados que, volta não volta, marcam diferenças que nos abrem o caminho do sonho. Mas são excepções ao sistema.
Insistimos em modelos competitivos desadequados e desadaptados à competição internacional. Deixámos que a visão paroquial e os seus interesses correlativos nos limitem as decisões. Por cada sucesso vemo-nos no domínio do mundo sem saber anotar as dificuldades e as circunstâncias do percurso ou as necessidades de construção futuras. Aprendemos pouco com os êxitos ou com os erros mas achámo-nos formidáveis. E não somos.
Sou, desportivamente, resultado de um ensino exemplar da prática desportiva múltipla – Colégio Militar – que fez de muitos de nós atletas de bom nível. Sei por experiência dos bons resultados do método – e sei por isso também que só teorias absurdas e realmente desinteressadas do Desporto podem impedir que um sistema escolar desportivo tenha uma iniciação e formação desportivas de qualidade e que possa promover hábitos desportivos de bom nível que se distribuam por dois caminhos: o da prática desportiva de lazer – a tão necessária actividade física ao longo da vida – e o do desporto de rendimento. Tudo de acordo com as capacidades e interesses de cada um.
O que exige – e não haverá orelhas moucas que fiquem inocentes - uma alteração urgente do actual sistema. Passando por modificar a Missão das Federações de Utilidade Pública Desportiva focando os objectivos estratégicos da sua actividade nos resultados internacionais, garantir programas de iniciação e formação desportivos múltiplos impedindo a formação unilateral, estabelecer um sistema organizativo adequado e capaz de articular a envolvente do atleta de acordo com os princípios da responsabilidade cívica e da educação e perceber - culturalmente perceber - que o Desporto é uma actividade que se organiza pelos seus próprios méritos e que se diferencia nos métodos das outras actividades por mais semelhanças que possam ou pretendam aparentar.
O Desporto possui corpo próprio de princípios e regras que não podem ser confundíveis com outros campos ou domínios e exige os seus próprios métodos de observação, de análise e de dedução, para o estabelecimento dos seus próprios indicadores na procura dos seus próprios resultados. Altius, Citius, Fortius, sendo o lema Olímpico, explica tudo: o Desporto é um espaço de superação comparada e com o ATLETA no seu centro nevrálgico. E é também disto que o desporto português necessita urgentemente: saber colocar o ATLETA no centro das suas atenções.
*Aprendi com meu Pai, Raul Bessa (1924-1991, um dos fundadores da EDP e seu presidente durante alguns anos, o conceito: se é preciso mudar, a melhor altura é agora!