quinta-feira, 3 de março de 2011

Uma Visão Poética


Vi há dias a curta-metragem de Manuel Oliveira – “Painéis de S. Vicente de Fora, Uma visão poética”. Infelizmente numa cópia em muito mau estado – questões de falta de maquinaria no MNAA – que só permitia ter um visãozita da coisa formal para quem tivesse memória das cores reais da pintura. Percebi a maestria do tratamento – tenho curiosidade para ver uma cópia decente – e também a interpretação que propõe a visão poética. Filmado com câmara fixa e em campo e contracampo, os figurantes são chamados ao lado de cá por S. Vicente e, revendo-se no retrato, ouvem-lhe a explicação textual. O encontro de católicos, judeus e mouros a que se junta, á fidalguia presente, a figura do pobre (designação para a figura do painel da relíquia) representam a capacidade portuguesa do encontro a quem a mão do santo impõe o final da guerra numa visão humanista e pacificadora. 
Não sendo aquilo que penso representarem os painéis é uma interpretação – uma visão como lhe prefere o autor – com a qual, mesmo que possa sobrepor desejo à realidade, se pode conviver.
Uns dias depois voltei ao Museu para ouvir a conferência de António Valdemar sobre "Os Painéis: Polémica, Tragédia, Comédia". Estórias divertidas do quase ao murro na Brasileira ao diz-que-disse carregado de mistério, história e os nomes dos que foram dando à excelente pintura todo o mistério que carrega, passaram durante o tempo da conferência. Interessante também a interpretação do conferencista das razões das interpretações sobre o significado do políptico: há, propõe, uma relação directa de cada interpretação, de cada forma de ver e de adjectivar, com os acontecimentos da História do Portugal contemporâneo. À República em 1910, a Sidónio em 1917, ao início da Ditadura em 1925, à exposição do Mundo Português em 1940, ao fim da guerra em 45, à candidatura de Delgado em 58, às Comemorações do Infante D. Henrique de 60, ao 25 de Abril de 74, correspondem propostas e interpretações diversas e adequadas a cada momento histórico.
No final a pedra de choque atirada pelo conferencista sobre o longo mistério da mais excelente pintura do património português: Decorridos 100 anos… o que ficou?
Mistério, dir-se-á.

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