Os encierros das festas de S. Fermín em Pamplona são um espectáculo que tento não perder, manhã cedo, nas excelentes transmissões directas da TVE. Nas ruas do casco histórico da cidade milhares de pessoas - cada vez mais mulheres - correm com touros e cabresto num percurso tradicional que os leva até aos curros da praça onde serão corridos à tarde. O objectivo não é correr por correr, é correr à frente e na cara do touro e há quem o faça de forma soberba - ao fim de anos a ver já reconheço os históricos - e é notável a forma como, no meio de toda aquela confusão onde não são poucos os que só atrapalham, conseguem manter a frieza e, com um toque de jornal ou de mão nas hastes, conseguem impedir cornadas nos que se deixaram encurralar. E não deixa de admirar, dadas as circunstâncias, o escasso números de feridos que, ao fim e ao cabo, acontecem. Magia do capote de San Fermín, dizem - e, bem vistas as coisas, deve ser verdade. Para isso os três pedidos iniciais e diários de protecção...
O que os touros podem vir a fazer é incontrolável, a reacção dos corredores menos experimentados também, o que nem sempre dá bom resultado. Mas faz parte.
O que já não faz parte é o erro daquilo que é controlável. E foi o que aconteceu no dia 13 de Julho. Por estúpida subserviência - para deixar entrar uns "policias forales" para a trincheira como se fazia há vinte anos - uma porta foi demasiado e desnecessariamente aberta num espaço de quase dois lado a lado e acabou por tapar metade do espaço de entrada na praça, provocando assim um montón. Corredores a aumentar o monte, abafando os primeiros caídos e - para receio geral - com os touros a chegar e a encontrar, na sua frente, um tampão humano que não os deixavam continuar para a arena.
Sorte, sorte foi que os touros bateram e ficaram e os cabrestos não tentaram trepar pelo monte humano acima. E alí se ficou, com a cobertura do capote do santo, até que a inteligência voltou: os touros foram levados por dentro da trincheira para entrar na arena um-quarto de volta depois.
Momentos de enorme ansiedade, momentos de pânico de quem tinha que suportar toneladas de peso em cima, momentos de pavor para muitos que viam e nada podiam fazer. O capote de S. Fermín limitou o número de feridos - um apenas com séria gravidade - a vinte e três, a maioria ligeiros. Uma sorte, um alívio.
Na sua tese, Cipolla tinha toda a razão: a estupidez tem péssimas consequências. Mas porque o capote não estará sempre atento - o diabo tece-as - aquelas portas nunca mais se abrirão: ordem definitiva do consejal.
Mais vale tarde que nunca, diz-se.