quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Assalto ao Quartel de Beja, 1962

Almocei com o Edmundo Pedro. Para além de me ter feito a simpatia de me entregar para ler o capítulo inédito “As três tentativas para tomar o quartel” sobre o “assalto” ao Quartel de Beja a 1 de Janeiro de 1962, ainda tive a oportunidade de conhecer outras estórias que fazem a história – a do cognome de “Capitão Pimenta” como era chamado em Caxias. “Capitão” vinha-lhe de Beja onde se fardou – por 3 horas como gosta de frisar – de capitão. A pimenta diz respeito a uma tentativa de fuga do Tribunal de Santa Clara que só não se concretizou porque, depois de ter atirado com pimenta para a cara dos seus guardas, correu escada abaixo em direcção ao carro que mão amiga tinha estacionado próximo e em situação de fácil fuga. Só que…a porta tinha ficado trancada e a fuga terminou ali, agarrado pelos perseguidores com ajuda de um bom cidadão que lhe fez frente ao grito do PIDE de agarra qu’é ladrão! .

O que mais impressiona no capítulo que li sobre o “assalto” a Beja é que, estando-se em 1962, as coisas se tenham passado assim. O que demonstra bem o atraso de país que então éramos – o paraíso salazarista que saudosistas gostam de encenar - e que, hoje, temos enorme dificuldade em acreditar que assim fosse. Manuel Serra acreditava que podia tomar o quartel com uma ou duas pistolas; Edmundo está até convencido que podiam ser de brincar. O facto é que o quartel só não foi tomado – por uma força de assalto mista de civis e militares - por azares sucessivos numa sucessão de acontecimentos misto de reais dificuldades – a vida, embora parecendo filme, não é cinema – e de sucessivas ingenuidades que a razão do combate pela Liberdade terá ampliado.

Um sinal dado cedo de mais, uma retirada de sentinelas não realizada, uma pistola que inadvertidamente se dispara, uma precipitação e um ferimento grave de que resultou a força de assalto ficar sem comando militar e serem perdidos homens de acção para transportar o ferido ao hospital, o não aprisionamento – por ingenuidade romântica ou por necessidade de apoio ao camarada ferido – do comandante da Unidade, uma armadilha de que resultaram dois mortos e um ferido grave no lado dos revoltosos, a impossibilidade de controlar – por falta de articulação – o centro de comunicações que permitiu chamar a GNR para cercar o quartel e, na única sorte dos deuses, que dispararam sobre o membro do Governo que teria vindo saber dos acontecimentos, ferindo-o gravemente e obrigando à vinda de Lisboa de uma equipa de médicos de grande competência que acabou… por salvar a vida ao militar revoltoso ferido que comandara a operação.

Ler este capítulo abre-me as maiores expectativas sobre as restantes partes do livro. E permite reflectir sobre o Portugal de então – sobre o atraso, o medo e a estrutura de terror policial que nos manietava - e que podia ter tido nesta acção o 25 de Abril, doze anos antes, mesmo apenas com duas pistolas de ameaça.

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